existias
muito antes de me dares à luz,
talvez desde o tempo das cerejas
ou dos invernos que preferias à canícula de Agosto.
existias muito antes do tempo
em que passei a existir no ventre,
nos braços
ou nas caminhadas lentas dos tempos recentes.
existo através de ti, por ti,
-mulher, professora, mãe,
emigrante, cátedra, defensora
da Liberdade e da Democracia
e do Saber.
existias como as rosas: viço e perfume,
beleza e suavidade,
decidida e segura,
antes das tonturas
e da lentidão dos passos.
sabes, minha mãe,
que não soube nunca
ser sem ti, sem te saber por perto,
sem poder olhar nos teus olhos
agora dolorosamente ausentes.
era simples.
estavas lá, à minha espera.
sabes que as aves cantam na nossa rua,
e que as rosas dos vizinhos voltarão
a desabrochar
naquele canto do caminho
que fizemos juntas:
olho para tudo para que vejas,
através dos meus olhos,
tudo aquilo que te corria nas veias:
desejo de simplicidade,
de natureza
e de lealdade
e, vendo,
acredito que os teus olhos vivem
através de mim,
por mim,
para me aquietar o coração triste
onde a tua ausência se demora
e sou menos, infinitamente menos,
do que era,
do que podia ter sido,
do que queria ser
aos teus olhos,
os únicos olhos onde fui imensa, maior
do que eu mesma,
maior do que a promessa,
e infinitamente menor
do que o teu amor.
Susana Duarte, tua filha.
A Senhora Professora Maria Elisa Rodrigues Ribeiro, minha amada mãe 🙏