quinta-feira, 28 de julho de 2016

onde te escondes, quando a noite cerca as sombras
e as desfaz, tornando-as nébulas no olhar, e densidade
negra por sobre as espáduas e o ventre?

onde te escondes, sempre que a noite vigia os incómodos
sussurros dos amantes, mitigados pelo raiar da lua que, sobre 
os corpos, se declina em invulgares contornos, de corpos 
redondos e interstícios onde as peles se não encontram?

onde quer que estejas, és o olhar que se estende sobre os dedos
que movo no ar, incógnitos bailados do pensamento, 

onde tanto se diz, por entre aquilo que se procura.

Susana Duarte




terça-feira, 19 de julho de 2016

quando chegares, não acendas a luz:
ilumina-me com o futuro liquefeito dos teus dedos
e olha-me, com a vertente solar
dos teus olhos.

quando chegares, avisa as aves:
soletra cada uma das plúmulas com que desenhaste
as ausências, essas, que fizeram de ti
o sonho apátrida
das noites.

ilumina-me, então, com o voo abrupto
dos desejos sobre os lábios;
com a sombra ambígua
das manhãs

e com o eco vago das quimeras.

quando chegares, não acendas senão o peito,
e olha em redor das mágoas:
saberás que as noites
apátridas

têm recantos onde as aves
se iluminam; onde as plúmulas desenham círculos
na madrugada, e as mulheres se entregam às brumas.

talvez saibas, então, qual dos caminhos
trilhar. no voo abrupto das aves
sem nome.

Susana Duarte

segunda-feira, 18 de julho de 2016

"(...) e, às vezes, tenho a sensação que se disser mar em voz alta, o mar me entra pela janela (...)" 



Al Berto


Foto de Susana Duarte

sábado, 16 de julho de 2016

procura.

trago-te em mim, como trago as nódoas das outras vidas e as partidas todas, de todos os portos do mundo.

revejo-te, como a uma mirabolante caminhada sobre as traves de madeira dos ossos, e neles inscrevo a tua presença, anónima, arqueada e inocente.

 trago-te em mim, todas as noites, aceso como as luzes e os sons que já povoaram a terra, castanha e húmida como as nozes da existência feminina.

és, de todos os motivos, o mais perecível, e o mais eterno, como as maçãs perpetuadas numa tela.  as maçãs, são os seios que seguras na linha que antecede a noite, e o perímetro dos sonhos onde encontrarás, de novo, a realidade e o ser.

perdes-te, tragicamente, onde se agitam as nuvens. a nesga de céu que abominas é a mesma onde me passeio, despida, sôfrega de sol e de vento, aurora desfolhada de todas as luas que me nascem dentro.

e permaneces cera, e permaneces voo antecipado, Ícaro naufragado com a força das asas sepultas.

procura. serás a mão que antecipa as marés.

susana duarte 

quinta-feira, 14 de julho de 2016

“I wasn’t meant for reality, but life came and found me.” 

― Fernando Pessoa, The Book of Disquiet


quinta-feira, 7 de julho de 2016



Era la tua mano
che sfiorava la goccia 
ferma sul labbro?

Non feci in tempo
ad averne coscienza
subito persa
nello smarrimento.



Poema de Zina Bianca









Fotografia: Susana Duarte

 metade de mim é silêncio. onde o silêncio habita as margens das veias, habita igualmente o mar tempestuoso  dos meus pensamentos. metade de...