domingo, 23 de março de 2014

JÁ NÃO HÁ DOMINGOS

Todas as vidas gastei
para morrer contigo.
E agora
esfumou-se o tempo
e perdi o teu passo
para além da curva do rio.
Rasguei as cartas.
Em vão: o papel restou intacto.
Só os meus dedos murcharam, decepados.
Queimei as fotos.
Em vão: as imagens restaram incólumes
e só os meus olhos se desfizeram, redondas cinzas.
Com que roupa
vestirei minha alma
agora que já não há domingos?
Quero morrer, não consigo.
Depois de te viver
não há poente
nem o enfim de um fim.
Todas as mortes gastei
para viver contigo.

Mia Couto


Sem comentários:

Enviar um comentário

 irrequieta perante o desconforto das lágrimas (talvez quieta quando me abraças, inquieta quando me percorres com os dedos  e me abres camin...