um dia, esquecer-te-ás do meu nome:
talvez te lembres que nos conhecemos
no lado solar de uma estação de comboios,
por entre passos soletrados e a imensidão
das solidões que passavam por nós.
chamarás o nome antigo das horas passadas
no silêncio cúmplice dos corpos, e serás triste
como os olhos que deixaste. um dia,
esquecerás que fomos um, tropeçando
nos dedos como quem ri, nos corpos
como quem tem fome e sede e desespero
e a impressão digital das lutas antigas.
ainda te lembrarás das palavras, mas nada
terá o sal, o sangue e o fogo dos dias
tornados perenes num seio frio.
partiste, e como quem parte, deixaste
os lábios de outrora, interditos como amoras;
serás sombra, e pó, e o piar de aves
sem sonhos, ou o vôo de plúmulas perdidas;
serás a sombra do sonho e o uivo negro
dos olhos que fechaste na tarde setembrina,
naquelas linhas escritas a ferro,
onde as lágrimas não bastaram.
Susana Duarte