domingo, 30 de dezembro de 2012

OPUS

obra,
sabedoria prenhe de gazelas
sobre folhas caídas do peito

obra imperfeita, perfeita, inacabada e acabada
mantida nas pálpebras,

... sobre o chão de folhas
da alma:
inverno nú, ave rasteira à terra

____ave entre as pernas da noite_____

obra acabada. solidão imperfeita:
olhos de água, rasos de auroras
nunca mais acontecidas.

flores do meu dorso,
em alvoradas desmedidas.
alvas estrelas de som, em noites imperfeitas

que, na hora de todas as quimeras,
se apoderam de todas as luzes do ventre
e me tolhem da quieta mansidão do sono.

hibiscos rosa. claridade do sonho:
habitas-me todas as utopias.

desagrega-me. agrega-me à areia do teu corpo.
serei obra acabada, quando for, em ti.

susana duarte
poema e foto

domingo, 23 de dezembro de 2012

___desenhei, no azul, a expectativa e o caminho
onde, de asa em asa, as pernas se transformaram
em escamas, e as escamas, na estrada marinha
percorrida. Sob as tuas mãos, a pele desnuda
da noite e, na noite, a sombra caída dos dias___


Reinventaste a noite. Na noite, a ausência da solidão.

 
O desenho da tua mão espalma-se na minha boca.


A tua mão redesenha o meu grito. 


Silêncio.

Na clara manhã do silêncio, o beijo.
 
 
 
Susana Duarte

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012


Roseirais
 
 
 
fechei as estórias
sob uma balaustrada
onde,

incógnitas, residiram vozes de aves antigas

memórias de beijos
divididos

... sob a égide dos solares dias
passados

hoje, revejo a história dos nossos dias
e procuro, nos roseirais dos nossos olhares,
o sol
remanescente

o sol que, sobre a eternidade das peles,
leva os amantes ao altar das luzes
e ao vermelho-carmim de todas as bocas

em todas as bocas te amei
e em todas, te procurei

para, enfim, sobre o sol dos teus lábios
morrer

vivendo ligeira
no recanto dos teus olhos,
de onde me resgatas as noites

ave-sol-viajante-das minhas marés,
eternidade dos meus olhos,
permanência da boca sobre a pele

susana duarte

domingo, 18 de novembro de 2012


vou ser borboleta negra, de douradas asas

inexistentes, subitamente dispersas
sobre cumes onde crocitam negras gotas
de chuva, de sal, de fogo, de fugas, de fátuos
e vagos movimentos, lentos, estranhos, solitários.

vou ser a sombra que transpareço,

nas ervas verdes de um chão sem nuvens,
aladas, translúcidas, ensimesmadas e brancas
como rododendros desconhecidos, e o branco pano

da seda que, nos olhos, me antecede os dias
e tolhe da sabedoria das coisas simples, raras pérolas
negras, como os corvos que me habitam, e me tiram

luzes do peito, e me escrevem sombras nos olhos,

e me falam de casas com flores, onde o som das águas
é oco, surdo, como os passos que dás. e não vejo.

_____________________________________________
sobrevoo as linhas naufragadas


susana duarte
 

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

CORPO





transformar-me-ia em ave,
se as asas dos teus dedos me ouvissem

e condensassem, em nós,
as gotas acontecidas

nas costas,
onde te deixei estradas

quando, em mim,
e nos dedos,
e no rosto,
e no ventre,

deixaste rotas marinheiras,

flor de sal do teu corpo,

sabedoria nua das marés,
ave de todos os dias

negro irresoluto de todas as noites

susana duarte
 
http://youtu.be/MqoANESQ4cQ

terça-feira, 30 de outubro de 2012


a noite do nada



os sonhos são tão longos,
quanto desnecessários

nados-mortos da existência,
sublimes momentos de não-verdade

 abomináveis momentos de ocultas asas
e de obscuros beijos
silenciados

os sonhos são etéreos corpos
que não existem nas mãos
nem nos corpos,
nem nos ventres,

apenas estrelas ocultas,
desnecessárias e belas

raízes de Nada

(susana duarte)
 

segunda-feira, 22 de outubro de 2012



 
 
PASSOS
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 




 
 
 
 
revejo-te na luz silente da tua pele, e na noite ambígua
das tuas mãos. revejo os teus pés de romã e a língua rubra
de todas as manhãs. é na luz submersa do despertar
que sinto os teus passos, que não oiço, que não vejo.
são nebulosas, os teus passos. são passos ausentes,
os teus passos. são pássaros de fogo e eternidade
na luz débil das estrelas. são a água que escorre dos
meus braços e a língua de fogo do meu ventre escondido.
revejo-te silencioso, nas estórias que me conto e na memória
de uma noite sob a água e a chuva e a dança das mãos.
da tua pele, fiz uma manta de retalhos de sombras,
e com ela teci a obnibulada manhã do despertar dos ossos.
é com ela que me visto. é com ela que te visito.
é assim que te sei. manhã submersa de cada recanto
dos meus olhos. tecido estranho das vestes das noites.
visão ansiada das pálpebras da realidade. pés que caminham
sobre o chão que piso. geometria de tudo o que sei. pele.

Susana Duarte
foto de Ivano Cetta
 

 

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

é ausência. e a ausência faz-se voz
em mim
e nas flores que percorro.

na ausência me cerceio
e na ausência me morro.

susana duarte

sábado, 13 de outubro de 2012

dispo-te e sigo-te os caminhos

através de corredores por onde,
nús, se passeiam espectros e onde,
silentes, voam palavras antigas

dispo-te e sigo-te os caminhos,

desnudo o ventre e as auroras e
toco as nuvens por um instante.

mas é na boca que me queres,

dispo-te e sigo-te os caminhos,

e é da boca que sai a súplica
para que te deite sobre mim

e me dispa de tudo o era dantes

dispo-te e dispo-me das memórias.
pode ser que esqueça as lágrimas
da noite, e o teu corpo seja a rua

e o meu corpo, a alma nua,

de onde te levantas a cada madrugada.

susana duarte

domingo, 7 de outubro de 2012

SI BEMOL
 
 
Mel da noite
que escorre em
flor sobre
as luas das
noites das

ruas
onde uma mulher
sozinha
exclama a terna e
...
pacata lucidez de
ser

em si bemol

susana duarte

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

AMOR

a mulher desnuda a alma luzente,

semeadora de luzes

onde a luz poente

se detém...abismo

...
de onde se levantam as luzes do ventre,

e se vislumbram transparências

na lucidez

das águas; nela, crescem e se afundam mágoas,

e as esguias margens de um rio.

a mulher desnuda-se nos braços amados,

plantadores de sementes

onde as névoas se dissipam

e as quedas acontecem no seio dos abraços

devolutos à sua eterna condição

de Ser em outrém,

na bravura das ondas que são corpos,

movimentos sincopados

de um oceano vivo

dentro dos olhos,
ágape dos cristalinos,
melopeia coralina
das imagens dos amantes.


amar acontece no espaço do corpo

onde tempo e distância se tornam

universo inexistente.

primavera de giestas vivas
onde a lava incandescente

são folhadas caídas da pele,

escamas vivas de sermos Um,

na imensa amálgama do universo.
 

 susana duarte
 
(foto Google)

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

.entretece-me as malhas das veias na urdidura de um tear antigo.

.na claridade entrevista nos poros, escrevi a sangue a tua presença.

.destinei-me às linhas das tuas mãos, como as cerejas são da primavera.


.agora, na noite que me espera, compro linhas onde fio mantas de retalho,

inscrevendo nelas as estórias vividas e aquelas que, em fio invisível,

aguardam ainda o novelo que lhes desenhará o futuro.

 susana duarte

sexta-feira, 28 de setembro de 2012


 
 
 
somos aves. somos flores. somos mágoas.somos névoas dissipadas. somos fráguas. densas rendas desenhadas sobre o vento. densas lendas desenhadas no desalento. densas aves desenhadas no papel. suaves flores. suave mel. somos ausência. somos dúvida. somos dor. somos obra vasta, penhor das nuvens, borboleta. somos a renda escavada numa gruta. desenho leve das águas. lenta dúvida que se desfaz. trégua na noite. suave onda. somos estrela alva na aurora desfolhada. breve canção, montanha escalada. somos a folha e a gota de orvalho, a fada etérea e a rocha e o galho. somos teixo, égua, albatroz. somos fruta. somos noz. somos deserto nas noites coalhadas. somos água e bico e sede. somos tudo. somos nada. somos vida. somos morte. somos acaso, destino, sorte. somos deuses e maçãs. ruas. estradas. manhãs. somos eu, e somos tu, e somos um e outro, cada um do outro. somos a vida. somos a morte. somos cítara e somos sorte. música, fuga, escarpada. somos tudo. somos nada. somos a soma de todos os outros, antes de nós. a voz das fontes, a voz da voz. somos um, e somos outro. e descobrimos a fonte da vida, na água que jorra da boca de cada um. somos infindos. somos unos. somos, sobretudo, quando somos juntos. abraço o teu infinito. somos aves. somos flores. somos céu. desdobra-te em mim. despoja-me de mim. sejamos o começo. e o fim.

susana duarte
(imagem: google)

terça-feira, 25 de setembro de 2012

as aves solitárias
moram na bainha das folhas,
e migram através das nervuras,
e desfolham-se no limbo;
atravessam pecíolos, e navegam ondas de som desfocado.
as aves solitárias
moram nos espinhos achatados,
mas almejam a endoderme do sonho.

moram na endoderme do sonho.

as aves solitárias têm a forma obcordata do amor,
e desenham cores variegadas na confluência dos toques

das mãos.

susana duarte
 
foto de ivano cetta
 

domingo, 23 de setembro de 2012

sauda-me a tristeza, a partir das janelas de onde, antes, brilharam estrelas de vida, ante a visão de ti e das tuas carícias. sauda-me, e eu deixo. sauda-me a saudade, e eu deixo. sauda-me a vida que tive dentro, quando contigo sonhava. e eu deixo. saudas-me tu, no abraço demorado que me deste e, todavia, me prometes. e eu deixo. sauda-me a tristeza, mas não te deixo partir. sauda-me a vida antes de mim própria. e eu deixo. sauda-me o brilho dos teus olhos. e eu deixo. neles vivo. neles morro. e eu deixo que a vida me preencha de vida. e eu deixo que a vida me preencha de morte. e eu deixo. mas deixo sobretudo que o sonho não morra. deixo que me vivas. deixo que me habites cada movimento das pálpebras. deixo que me sonhes. deixo que tenhas saudades de mim. mesmo quando a tristeza me habita. mesmo quando a saudade me desespera. habitas-me. não sei ser sem ti.
 


susana duarte
 
foto de Ivano Cetta
 

 

domingo, 16 de setembro de 2012

Um poema meu, traduzido pela querida amiga Tiziana Calcagno (gracias, Tiziana!)

NOMBRE

Te imprimo en el borde de mis sentidos
donde el limbo apenas es un camino

salto de hoja en hoja y en la naturaleza viva de tus manos
abro mi boca sedienta del agua que sale de tu cuerpo

...
Ondeo las líneas de tu tallo y
me nutro con tu vida:

semilla,
fuente,
flor nocturna
y durazno rosado;
luz naciente
ángulo inexistente de una curva,
cuarto creciente
de mi luna.

te imprimo en el rincón ambiguo de los sueños
a la espera del sol naciente, cortante de mis venas

amplitud de navegación de las flores, en la cala
donde vestí las flores al mirarlas,

luz

cueva de lobos de una nueva montaña
donde imprimimos la especie, en los ojos azules de tu boca

te imprimo en el borde de mis sentidos
donde el limbo es el margen de la vida

por medio de encrucijadas y ligaciones extrañas
pero donde siempre reina tu nombre…

susana duarte
Tradução: Tiziana Calcagno
POEMA

todos os dias, o poema
de ser poema todos os dias.

todos os dias o poema de seres poema
nas minhas veias. todos os dias, o poema

de seres verdade. todos os dias, a verdade de seres
Verdade absoluta dissolvida nas margens das artérias
e inegável Poema dos capilares do sentir. todos os dias.

susana duarte

sábado, 15 de setembro de 2012

NUDEZ

estou nua,
e o espelho, à minha frente.

oiço a passagem de uma borboleta azul
que se poisa no ombro onde, outrora,
habitou a suave flor de um beijo, e o sabor
das romãs, desocultadas da noite,
vencidas pelas manhãs cansadas
...
do amor e da seda
dos teus braços.

na nudez,
celebro as asas da noite.

a noite em que, nua, me desfiei sob o olhar
que me navegou e,
sonhada,
desviei os medos
e todos os anseios anteriores.

escondi-os num rio oculto,
onde fingia viver,

e nas tuas mãos,

através das tuas mãos,

descobri-me perseida
na nudez
dos teus braços.

susana duarte

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

SÚPLICA



ouve-me nos movimentos das pálpebras,
onde é sonora a ausência em que habito;
onde se espraiam vozes sumidas; onde
vivem giestas, e piam aves estranhas...


olha-me nos recantos da paixão antiga,
e desnuda-me os ombros de aurora. sê
inteiro, marinheiro das minhas águas e
cálida emoção que se derrete no calor
das minhas lágrimas antigas. sê a luz
onde tudo, dantes, era ilusão de néon.

ama-me. e devora-me os olhos e a boca
e os braços com que te cerco e sinto.

sente, de mim, a lágrima de luz coberta
de seda, onde te deitas e recobres de ser
marinheiro da minha sede. ama. em mim,
encerra as noites de aves estranhas, sê
luz ansiada-procurada-antes interdita. e

ama-me

susana duarte
 
 

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

MAR

na baía, encontrei uma concha
e os olhos da lua, num pôr do sol distinto e
inscrito na maré baixa,
onde deixei um pé preso nas algas
e me tornei o sonho de uma sereia que, na praia,
criou pés e, distraída,caminhou
em eternos sonhos de orvalho,
recitados num teatro onde a luminosidade
estranha

da noite,
a deixou perdida nos recantos do mar.

tornei-me navegante dessa concha,
consciente do tempo passado e futuro,
que pinto e
habito,
como se uma tela me deixasse eternizada

no mar que salgas

e transformas em chuva pálida na manhã serena.

Somos nós, nas marés,
que criamos cenas da vida que escorre na areia
e deixa marcas de pegadas
nos locais onde somos, em cada luar, seres mágicos e

indistintos.
Navegar.......

Navegar é o sonho
cavalgado pela lua cheia

numa onda que não há.

Mar.
 
 

 susana duarte
 
 

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

escreve-me nas flores da tua alma,

como escreves o azul
dos espaços
dos meus olhos.

.escreve-me nas janelas que abres,
 e nos caminhos-de-ferro
que percorres nas tardes
 em que as partidas

se transformam em corvos soturnos.

escreve-me na vida
 das vidas que vivemos,
e nas orvalhadas em que acordamos
e nos sabemos sós,


 eu em ti, tu em mim.


febre da chegada e do sabor
da flor
e da noz.

 .escreve-me.



.serei o mapa dos trilhos que percorres.

susana duarte
il sogno è un petalo di rosa... di Paolo Staglianò


Il sogno è un petalo di rosa...
dal
confine il cupo tono
...
di lontani rombi:
taglia dritta una pioggia fine:
è una compiuta rete la distesa.
un canto spegne ogni eco che risuona:
e non umani valicano cortine ]
un tempo diviso segna la mancanza
di un evento:
le tessere bianche
d’un domino infinito colmano
l’urlo di ogni cosa muta:

il sogno è un petalo di rosa…
il vapore lieve d’una follia bambina:
l’erba verde d’una età smarrita,
occulta al viandante il mito oscuro,

delle vigorie disfatti di falliti amori
che rincorrono le viole:
la mano perduta o rinata nei dadi
di una sorte riporta a lontane intese:

[ foto ingiallite nelle baite deserte,
ruotano dentro il vortice eterno delle ore ]

il sogno è un rincorrersi di ombre:
il gioco brioso del non vissuto:

lungo il viottolo taciuto delle more ]

Paolo Staglianò - il sogno è un petalo di rosa... da
[ Proxima del centauro ]Proprietà letteraria riservata
© 2012 by CSA Editrice




sábado, 1 de setembro de 2012

escreve poemas nas coxas da noite
e dela, faz nascer aves coloridas e
noites de paixão. das aves que tens
nas pernas, faz um canto de sal e dor
para, depois, transformares a dor
no suave suor de um sorriso trémulo

ante a visão do ser amado. sê. ousa.

vive nos olhos azuis da primavera
dos teus seios. e transforma-os na
nascente de todas as águas do mundo.



susana duarte
 

QUIMERA

diz-me onde moram as estrelas de Cassiopeia
e as luzes da candeia, que os pescadores empunham
na noite amada dos sonhos alados, de trovadores-cantadores
e de castelos, antigos e belos, onde me guardas num recanto, numa ameia,
e me transferes das estrelas para o alto das belas trovas que entoam sonhadores,

sonhadores-fazedores de estrelas, de louvores e de jóias raras, encontradas be...
las
e tranformadas em velas que iluminam o teu rosto de amante de uma sereia
que, no fundo do mar, perdeu a capacidade de nadar e ganhou a de voar,
e voou nas estrelas de cassiopeia, onde construiste uma ideia
maravilhosa de não-solidão e de não-espera. Quimera?

_______quimeras são sonhos e seres fantasmáticos; alegorias de um desejo
e de amores erráticos que, finalmente, encontram a raiz do ser na luz
eterna da navegação dos desejos__________
 
 
susana duarte (poema e foto, as usual =)
 
 
 

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

FUGA

Na música do encontro, bailam as notas da melodia
que, presas no mel da noite, e tocadas na luz do dia,
se desprendem de uma gota de chuva alheada do sol,

e se tocam nos ombros da tarde onde, lesta, se move
a pressa de sonhar. ( A pressa de ter a tarde no rosto).
...

A vontade de mosto, em tarde de Setembro. O doce
suor de Maio, uma chuva de Novembro. (De onde és?)

Na uva sacarina de uma música que se sobrepõe a mim,
A fuga é o contraforte de sons abertos ao dia. (Melodia).

Notas que fogem de outras, em alegre consonância,
na alegria com que derramas a voz no toar da Canção.
Diafragma de uma debandada de aves inscrita na noite.

Apóstrofo de um diálogo. Ave solta. (Céu azul. E Evasão.)

susana duarte

terça-feira, 28 de agosto de 2012

DATA


soam palavras de amor e presença, na noite iluminada
dos teus olhos e da nossa ausência; um mar de aves
sabedoras da vida, voeja sobre os nossos olhos

de demanda e sal; de procura e água, salinos-
-hialinos-de água-vidro-pó dos desertos
onde sobrevoámos areias e maresias
...
estranhas de encantadores da vida,

vida-vivida-em teus olhos resplandecida, saber
ao sabor dos teus beijos, fonte de sabedoria
e de todos os meus desejos. ave azul das
manhãs em que sou mais, em que sou
o azul dos teus olhos e as curvas
das minhas coxas. nelas,
resides tu, saber-sabor-
sal de toda a vida

que temos dentro


-1 ano depois-
27 de agosto de 2012

 susana duarte

domingo, 26 de agosto de 2012

ARABESQUE

Vou desenhar um arabesco no cabelo de uma flor.
 

 Um bailado
de uma noite em teu olhar
e teu calor. Uma dança, uma maré
de estrelas inauguradas numa praia de algas verdes,
dançadas por ti. Dançadas por mim. Dançadas na chuva estival
de uma noite de Perseidas. Talvez seja fruto alado, a
estrela que te guia. O candeio que te alumia, e a ave
que te percorre. Em teu sangue, nada morre. Em tua
veia, de serena alegria, a dádiva da gota de
água, que o Silêncio desenha na estrada…
onde sei da Alegria, e faço o percurso,
e corro no mar, e ando
numa nuvem, e
deixo de remar,

 e sei que cheguei,
e sei onde estás, e
transformo o arabesco numa
nuvem de eternidade, desenhada numa
flor, onde vives, sem idade e sem morada, sem deserto,
sem ter nada, senão a absoluta cumplicidade de um olhar
onde uma gruta foi escavada pelo vento que eu era.

Semeei a espera que é dádiva e é dança.
Um ornato numa
esteira que é fio e contradança.
Florear a letra na imagem
onde uma bailarina rodopia, numa Coda.

Em teu nome, danço flores.
 

 Tempo.
Ampulheta.
Bailado.
Teatro de aromas…palco… cores.

  susana duarte

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

combate-se o silêncio


com as palavras escritas,
cravadas
a golpes de lapiseira
no papel imaculado


...
combate-se o silêncio

com os diálogos
travados
entre si e si,

na imaculada folha branca da alma.

só não se combate o silêncio
onde as palavras já morreram

concretas
incorporadas
definidas
alinhavadas no tempo
e no espaço


das memórias dos lugares sob

a pele.




susana duarte



terça-feira, 14 de agosto de 2012

REGRESSO


volto à noite
como, após cada noite, regressa a nós
a madrugada.

regresso ao ventre
...
e à espada, movendo-me
em ti

como se fosses vida renovada.

volto a cada desejo
partilhado sob as águas da chuva,

e volteio em cada gota,
noturna como as aves
noturnas;
madrugada de mim mesma;
flor orvalhada

semeada
sob a chuva dos teus olhos.

volto à noite,
porque volto a ti.

mais, não sei, senão regressar.

susana duarte

 

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

TEMPO DESFOLHADO

______o tempo traz as flores acomodadas no peito_________

desfolha-as, no impulso firme de ser vento,

desacomoda-as de si, do caule, da voz das águias,
no movimento forte de ser vento,

e volta a deixá-las ser flores,
...
apenas por um segundo,
quando os olhos se movem ao encontro das mãos

e o tempo volta a ser tempo

e o tempo acomoda o peito

e as flores

e o vento

e os caules
de ser ave
levada nas ondas sonoras

do dia em que as mãos partiram

e deixaram as flores desfolhadas no peito
do imenso desalento

da tua ausência

_________até que o Tempo volte a ser tempo

de me desfolhares o peito______________

e de escreveres as pétalas das flores

____________________________________________em mim.

susana duarte
morde os braços,
na ausência das nuvens
onde Eros e Psyché deram as mãos.

no silêncio da altura vislumbrada,
na raiz das virtudes e de todos os embaraços,
eis a noite sonhada dos abraços
e dos corações descobertos
_________________

...
em céus encobertos
onde as nuvens
apenas
iludem.

Susana Duarte
canto as flores que te crescem nas asas, meu amor

no amor, canto as flores que te enrubescem o rosto, meu amor

em todas as línguas do mundo, canto as tuas flores

e, no ventre, escondo os sonhos e os olhares trocados
 
nas noites seculares dos nossos amores. janela.

janela na minha alma. alma entronada pelo teu rosto.
 


Susana Duarte, ouvindo Périplus de AMélia MUge e Michales Loukovikas
existe o regresso, ansiado e entrevisto,

 entre dedos e entre histórias, entre rostos e memórias,

 entre ditos, entre dentes e entre palavras dormentes,

suaves flores dos meus dedos. segredos.



 Susana Duarte
sou um rio com tantas margens desavindas
entre si. permaneço nas roupagens das algas.
nas algas, procuro os olhos das águias.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

eu-em-ti


.queria ser vôo e ser horizonte.

...
.numa praia deserta, ser a vida e a fonte
que te deixa ser asa e remo, nave e mar navegado,
fruta morena em terreno desbravado, onde se verte a lua
e navega a noite, ao som de um violoncelo-mulher-despida-de si.

.encontrar-me no horizonte onde os olhos são estrela do norte,


e sou eu-em-ti.



susana duarte

domingo, 29 de julho de 2012

Distância

a distância
na pele do poema

... subjugada ao egoísmo de desejar
e à eterna demanda da paixão

condensada

em rios de palavras

onde a vida se preenche de nós

susana duarte
descanso
sob as asas ocultas
nos seios

dos teus braços;
... sob o sol poente
da noite

do meu ventre;
sob as águas da tua boca
e da corporalidade
do teu ser.
descanso
sobre as ondas

descalças

dos poemas
que jazem nas linhas
das axilas,
onde encosto as linhas
do rosto antigo,
e me permito sonhar

cálidas
rubras
manhãs
em que acordo em ti.

susana duarte



domingo, 22 de julho de 2012

Círculos


desenhei-te com círculos de ar, no ar que me respira
e nas sombras por onde me movo. rezei peitos
... de noites serenas, esperando pela palavra
que, dita por ti, assumiria a dimensão
da vida.
iludida?
diria, antes,
encantada, nas asas da suave contradição
de ser mulher, e de ser arado que te lavra
as dores gramíneas do peito, de onde tiro as dores
que, saídas de ti, são o terreno onde se afogam medos.


desenhei-te com círculos no espaço da minha gratidão.


disse-te que seria sempre a asa levantada do chão,
onde a suave ditadura das tuas mãos me devolve
o ar. são de eternidade anterior, os teus beijos.
neles me deito. neles me concentro. neles
encontro todos os círculos
que tenho dentro.
neles, sou
a sombra da tua boca.
círculos da minha vontade.
círculos redondos das minhas coxas.
não saio de ti. concentro, nos círculos, os desejos.

nos desejos, sou-vivo-encontro-respiro-me, eterna em TI.


susana duarte


sábado, 21 de julho de 2012

Distância

a distância
na pele do poema

... subjugada ao egoísmo de desejar
e à eterna demanda da paixão

condensada

em rios de palavras

onde a vida se preenche de nós

susana duarte
ESPECTRO

torno-me irreal, no momento
em que a noite,
sobre mim, tece rendas de água
... e encantos estagnados no marasmo
das coisas e na paragem dos rios
e das romarias de lágrimas
no outeiro dos olhos, quebrados
pela visão quimérica da noite


torno-me irreal, quando a noite
sobre mim caminha,
tessitura de voos e de uivos,
gemidos-bramidos-sons surdos
do bater sonoro do ritmo da vida
e da alegria dos dias ousados,
ousados de rir,ousados de serem mudos

ouso

amar


no preciso instante
em que a irrealidade
das teias me quebra o ar
e me nega a vida e me tira os sons
das palavras
do peito


ossos

gelo rarefeito das noites



susana duarte




 

terça-feira, 10 de julho de 2012

inscrevo-te na bainha dos sentidos,
onde o limbo é, apenas, um caminho


salto de folha em folha e, na natureza viva das mãos,
... abro a boca sôfrega da água que sai do teu corpo

ondeio as linhas do caule e
nutro-me da tua vida:

semente,
nascente,
flor noturna
e pêssego rosa;
luz nascente
das minhas flores,
ângulo inexistente de uma curva,
quarto crescente
da minha lua.


inscrevo-te no recanto ambíguo dos sonhos,
na espera do sol nascente, rasante das minhas veias,
amplitude da navegação das flores, na enseada
onde verti as flores de um olhar,

luz,

alcateia de lobos de uma montanha nova,
onde inscrevemos a espécie nos olhos azuis da tua boca.


inscrevo-te na bainha dos sentidos,
onde o limbo é a margem da vida, percorrida

por entre cruzamentos e ligamentos e estranhos pensamentos

mas onde, sempre, reina o teu nome
 




 susana duarte


 

domingo, 8 de julho de 2012

ASAS
 
 
nascida das nuvens, renascida em ti,
soçobro ante a visão das coisas. contigo, vivi
e soube das luzes da noite. nascida das chuvas
e das vidas vividas, renacida de ti, chão de uvas,
uvas-mosto de um setembro oculto, revivo na sombra,
... a sombra etérea das gotas de chuva e a penumbra
dos olhos, iluminados pela cor cereja de uma vela.
nela, escondem-se os segredos dos amantes,
e dos dedos, e dos momentos delirantes
de milhares de segredos, inscritos
nos poros. inscritos em ti. nascida
das nuvens, renascida em ti, escrevo
diários de fumo na sofreguidão dos dias,
e na solidão dos dias, e na solidão fria
das noites. olho-te. fico em paz.
nasci das nuvens. renasci das tuas asas.
luz da minha sombra esquecida. vivo nas casas
onde existes. e morro na luz dos teus braços.

susana duarte
 
 
 
 
 
 
Nasço em ti


nasceste-me,
desaguando olhares sobre as estrias da noite,
... onde se demoram alucinações e sonhos desiguais,

onde demoras o ventre sobre as costas e nadas,
soluçando gritos e deixando transparecer a noite
onde me nasceste.

nasceste-me,
ventre renascido de águas azuis e flores silvestres,
framboesas do meu rosto e odor frutado de corpos
floridos.

nasceste-me,
onde a noite se fez água entretecida nas margens,
olhos das areias onde passeei ondas gigantes, levantadas
da raíz e do tronco da vida,

nascendo-me
nas horas claras das luzes impressas nos dedos,
imprecisas e paradoxais como o sonho, onde movo
as mãos e me encontro

em ti.
 
susana duarte


Foto: Ivano Cetta

domingo, 24 de junho de 2012

sou da ausência,
como sou da noite

escrevi-me na escuridão das almas
e inscrevi-me na ausência da pele

...
sou da ausência,
como sou da reflexão,

no espelho,

do que outrora sonhei; solidão das almas,
indesejada; inscrevi-me na ausência dele.

sou da ausência,
como sou dos sentidos,
nascida na noite das chuvas,
sonhada no tempo das uvas e,
violentamente, ausente de mim,
arrancada do peito que um comboio me roubou.

sou da noite, onde a noite findou.

resta-me, agora, descobrir quem sou.

Susana Duarte
SONHO


quis viver sobre as ondas vivas dos dias
e, depois, sobre os ventos do sul

fiquei soturna, rasando sob as nuvens frias
e, fria também, sonhei amar o eterno azul

...
quis ficar noiva das heras de países pequeninos,
onde poderia fingir ser asa, rémige de uma existência
de solares tempestades e de dias claros-azuis-serenos

nesse noivado, encontrei as mágicas horas-estranhas,
estranhas-horas em que o sol e a noite se cruzam
atrás do mar e das mágicas névoas

atrás das névoas onde se vislumbram seres,
vi os olhos da eternidade, serena, alada, vivente,
da existência da magia e das eternidades pequenas
de todos os dias de todas as nossas vidas


Susana Duarte

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Tessituras


.entretecimento de saudades nas veias.

...
tristeza-desmesura das noites, quadradas
e longas, diagonais sobre o pranto, levadas
de água na tempestade dos olhos. escolhos,
refúgio no abismo, borboletas negras
sobre as asas de um istmo, ternura-melancolia
e atração pelo mar. estar.permanecer. querer.
ficar. ficar nas ondas da barca das vozes
pressentidas. tessitura de névoas e de suores.


.entretecimento plangitivo das águas.

ventre-profundidade da vida, semblante
de uma noite estranha e temida, solidão
de uma tarde de sol. absinto de ser angústia.

.cipreste abatido pela soturna nostalgia.

Susana Duarte (palavras e imagem)
 
 
 
 

quinta-feira, 7 de junho de 2012

DESPIDA


Tenho os sentidos despidos de ti,
e de ti vestidos
na montanha de luas antigas,
na sáfara atravessada de rugas,
na territorialidade das névoas,
e na eternidade dos olhos.

...
De ti, retenho em mim a pele,
e na pele
dispo as cátedras do que sabia antes,
em dias que não sei,
em tempos e lugares onde fui outra,
em tempestades que retive na sombra
dos tecidos
do corpo.

Do corpo, despi-me na neve
e na neve das noites
enchi-me de ar,
volteei em ondas de som
e deixei-me encantar pelas nuvens
da mente.

Resido nas pontas feiticeiras
de um saber antigo
e dispo-me dos sentidos:
olhar,ainda que despida dos olhos;
sentir, ainda que sem tocar;
escutar, ainda que os ouvidos
alados
se tenham tornado viajantes
onde torres caem e mistérios
se levantam
nos dias
que sou.

Despi-me de tudo.
Prossigo em ti.
 


 Poema: Susana Duarte
Imagem: Foto de Ivano Cetta

.


quinta-feira, 17 de maio de 2012

 
 
 
 
 
 
 
 






SER


aconteces-me nas horas desconhecidas
em que os cumes
das montanhas
são névoas dispersas
sobre os sonhos onde ondeio

...
aconteces-me nas horas vigésimas quintas,
onde o tempo se torna infinito
e as luzes das flores
me invadem
os pulmões, e me respiram
de odores almiscarados
e sabores
novos

aconteces-me onde não me sei
e as horas me não bastam,
onde disperso horas
de certezas
e de loucuras de outrora

aconteces-me,
simplesmente
porque existes dentro das águas
que me habitam
o ventre,
e porque conheces
cada onda
do mar

outrora oculto


(Susana Duarte)



segunda-feira, 14 de maio de 2012

BEIJO

beijar-te-ia os olhos, se de ti se aproximassem as pálpebras e,
no ímpeto da proximidade, pudesse encostar, a ti, o rosto. seria
a impulsividade do abraço, o moto da vida e o caminho-espaço
onde o tempo se estreita e se torna infinito. a infinitude onde te
abraço, é a cor púrpura do peito e a negação da solidão. alma.
nesta cor onde navegas, habita uma ave, livre, a paixão calma,
nomeada, dita, entretecida nos momentos onde risos e lágrimas
...
se enleiam nos gestos e se tornam eternidade em nós. beijar-te-
-ia. suave melopeia de quatro olhos que se navegam. urze viva.

beijar-te-ia o centro navegante das noites e saberia se as aves
cantam em dueto. ouviria as doces notas do teu canto...pudesse
eu encostar, em ti, os olhos que tudo ouvem. esses, residem
no peito, escavado de doces memórias, onde é nosso o sorriso
da lua. beijar-te-ia. e saberias que é nosso o riso. pudesse eu
saber das noites inscritas no tempo onde não há tempo para ser
só. não há tempo para ser só. há tempo, apenas, para sermos
dois. um. eternidade inscrita no espaço das estrelas. claras,
luzentes, belas. sabemos de nós, e sabemos do peito. sabemos
do corpo, finito, estreito, conjugado a dois nas noites de chuva.

beijar-te-ia. apenas isso sei. declino em ti a maré. e tudo o que és,
é aquilo que sei. do mundo, nada mais importa. a vida vive em ti.

Susana Duarte
(poema e foto)
 
 
Para ti, i.f.
 
 
 

sábado, 5 de maio de 2012

[ VERLAINE ] - Le Rose Nere - di Paolo Staglianò -

da " Coriandoli di Pietra - Copyright della CsaEdtrice - 2008

Verlaine [ Le Pauvre Lelian ]

...

notte dura nell’ambirsi che abbonda,
oltre ogni discrezione, di bisogni che incidono
il profondo:
tanto che ogni tempo è pausa ostile,
statico pensiero:
nulla concede l’arido osservare questo
cielo che diviene aurora contro ogni mio volere:

[che ancora intendo di carpire al sonno
il bello d’un istante dentro un sogno ]

ch’é forse questo il tempo delle pietre aguzze!

sassi che rotolano lungo le chine acri del mio talento,
sfuggono fermi nei pressi di uno scopo:
ed è sevizia pensare di risalir ogni scalino infranto,
sedere al mio tavolo, evocare dal nulla creazioni:

[dolori consumati o attimi di bello assoluto
sminuzzati dentro la cinica macina d’ogni vita ]
Un vuoto largo privo di misura mi prende
come cosa che non da tregua:
come lamento atroce di un infermo:

e invariato si mostra ogni senso di cosa
che si muove, nel mondo [ spiegato ]
che ogni dì sbilenco osservo !
Come contemplo l’inerte che perdura,
il misurato:
il disdicevole conforme ad un estremo verso,
ogni grazia celata dietro l’odio che folto coltivo
in serbo per un mondo doppio remoto
dall’assoluto che dipingo!
mondo che rigetto che respingo ]
e in fondo accetto:

il frutto che mi appella, maledetto ]

Paolo Staglianò - "Verlaine" - Coriandoli di Pietra - Proprietà Letteraria Riservata della www.csaeditrice.it© 2008
ISBN 978-88-95030-46-3

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Nebulosa
 
 
soubesse eu das nuvens,
e moraria sobre um cirro.

sonharia sonhos de framboesa,
vermelhos-rubros-saborosos pecados
de veludo e de fé, por sobre sombras,
...

penumbras

escombros de nuvens,
brancas-pacificadas-nutridas na raíz
das partículas e dos sons, onde
habitam borboletas negras

e luzes.


soubesse eu das estrelas
e moraria no Cruzeiro do Sul.

voaria sobre emas,
oásis,
asteriscos de amores
e frases de cor ténue,

espalhando sonoras partículas
de navegações antigas

mares azuis,
sombras dissipadas

estrelas marinhas
refletidas nas curvas das nebulosas.

espiral.

Susana Duarte


http://youtu.be/O8ACZ6IyyqM

 

sábado, 21 de abril de 2012

as aves solitárias
moram na bainha das folhas,
e migram através das nervuras,
e desfolham-se no limbo;
atravessam pecíolos, e navegam ondas de som desfocado.
as aves solitárias
moram nos espinhos achatados,
mas almejam a endoderme do sonho.

moram na endoderme do sonho.
...
as aves solitárias têm a forma obcordata do amor,
e desenham cores variegadas na confluência dos toques

das mãos.

Susana Duarte
Pintura de Nicoletta Ceccoli

sexta-feira, 20 de abril de 2012

...mulher desnuda na alma luzente,

semeadora de luzes

onde a luz poente

se detém...abismo

de onde se levantam as luzes do ventre,
...
e se vislumbram transparências

na lucidez

das águas; nela, crescem e se afundam mágoas,

e as esguias margens de um rio.



...mulher desnuda nos braços amados,

plantadores de sementes

onde as névoas se dissipam

e as quedas acontecem no seio de braços

devolutos à sua eterna condição

de ser em outrém,

na bravura das ondas que são corpos,

movimentos sincopados

de um oceano vivo

dentro dos olhos,

ágape dos cristalinos,

melopeia coralina

das imagens dos amantes.





amar acontece no espaço do corpo

onde tempo e distância se tornam

universo inexistente. primavera de giestas vivas

onde a lava incandescente

são folhadas caídas da pele,

escamas vivas de sermos Um,

na imensa amálgama do universo.


Susana Duarte

(Pintura de Nicoletta Tomas)
 
 
 

terça-feira, 17 de abril de 2012

SÚPLICA


ouve-me nos movimentos das pálpebras,
onde é sonora a ausência em que habito;
onde se espraiam vozes sumidas; onde
vivem giestas, e piam aves estranhas...


olha-me nos recantos da paixão antiga,
e desnuda-me os ombros de aurora. sê
inteiro, marinheiro das minhas águas e
cálida emoção que se derrete no calor
... das minhas lágrimas antigas. sê a luz
onde tudo, dantes, era ilusão de néon.

ama-me. e devora-me os olhos e a boca
e os braços com que te cerco e sinto.

sente, de mim, a lágrima de luz coberta
de seda, onde te deitas e recobres de ser
marinheiro da minha sede. ama. em mim,
encerra as noites de aves estranhas, sê
luz ansiada-procurada-antes interdita. e


ama-me.

Susana Duarte
 

domingo, 15 de abril de 2012

 
 
VIDA

morrer nas flores do teu beijo


morrer no beijo onde as tuas flores
são desejos. desejar as cores dos teus beijos.
beijar as tuas asas nas sombras da tua boca, nos recantos
dos teus sonhos, e viver, como algaço vivo, despojo das marés
onde os beijos são a vida de todas as minhas vidas. morrer.
... flor de sal das tuas mãos. nelas, viver as cores dos cantos
e as rochas sedimentares dos dias passados em nós.
morrer no beijo onde as tuas flores são desejos.
morrer no beijo dos teus beijos.

viver a vida nos beijos que desejo


morrer nas flores do teu beijo

Susana Duarte
 
 

quinta-feira, 12 de abril de 2012

todos os dias, o poema
de ser poema todos os dias.

todos os dias o poema de seres poema
nas minhas veias. todos os dias, o poema
de seres verdade. todos os dias, a verdade de seres
Verdade absoluta dissolvida nas margens das artérias
e inegável Poema dos capilares do sentir. todos os dias.

Susana Duarte
Pintura de Nicoletta Ceccoli

sexta-feira, 6 de abril de 2012

que vontade, meu amor, de tornar longas as noites,
e frescas as madrugadas das gotas dos teus olhos


é aí, na nossa vontade, que sei quem sou.
orvalha-me com as gotas desse rio que se esconde nos teus olhos. orvalha-me de cores e das luzes onde nasces em mim.



Susana Duarte; foto de Ivano Cetta

cores. residem onde habitas tu. moram nas curvas dos teus olhos. sabem onde estão as pálpebras e os movimentos sonhadores das minhas noites. a eternidade reside nessas cores. é nelas que se escondem vontades e gotas de desejos. e flores nac...aradas. pétalas-sépalas-corolas de uma noite onde sou as tuas pernas, e as tuas pernas me nascem nos seios. onde há vontades madrugadoras, e as minhas mãos se separam de mim, e navegam nos teus cabelos. cores. é nelas que te vejo, me deito, te beijo e espero pelas luzes da tua boca. 




Susana Duarte
 
 

domingo, 25 de março de 2012





existe o regresso, ansiado e entrevisto,
entre dedos e entre histórias, entre rostos e memórias,
entre ditos, entre dentes e entre palavras dormentes,
suaves flores dos meus dedos. segredos.

Susana Duarte

sábado, 24 de março de 2012

 
 
canto as flores que te crescem nas asas, meu amor

no amor, canto as flores que te enrubescem o rosto,
meu amor

em todas as línguas do mundo, canto as tuas flores

e, no ventre, escondo os sonhos e os olhares trocados

... nas noites seculares dos nossos amores. janela.

janela na minha alma. alma entronada pelo teu rosto.


Susana Duarte, ouvindo Périplus de Amélia Muge e Michales Loukovikas

sexta-feira, 23 de março de 2012

 
 
 
FRACTAIS


um desespero estranho e poderoso reside na ausência
e no desconhecimento.
uma tristeza
avassaladora como uma vaga sombria
algures, no seio
da noite
onde caminha, serena,
a sombra
da solidão
... onde navegam pescadores
e flutuam sonhos
fractais
e vidraças

pintadas com imagens dúbias.

Susana Duarte

sábado, 17 de março de 2012

NUDEZ

estou nua,
e o espelho, à minha frente.
oiço a passagem de uma borboleta azul
que se poisa no ombro onde, outrora, 
habitou a suave flor de um beijo, e o sabor
das romãs, desocultadas da noite,
vencidas pelas manhãs cansadas
do amor e da seda
dos teus braços. 

na nudez,
celebro as asas da noite.
a noite em que, nua, me desfiei sob o olhar
que me navegou e, sonhada, desviei os medos
e todos os anseios anteriores.
escondi-os num rio oculto,
onde fingia viver,
e nas tuas mãos,
através das tuas mãos,
descobri-me perseida
na nudez
dos teus braços.

Susana Duarte



 metade de mim é silêncio. onde o silêncio habita as margens das veias, habita igualmente o mar tempestuoso  dos meus pensamentos. metade de...